A Revolução Francesa com sua Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão foi o primeiro marco civilizacional da época moderna, estabelecendo direitos civis. A luta dirigida pelo movimento operário internacional consolidou direitos políticos e sociais. A emergência da barbárie, agravada por esse sistema financeirista e monopolista que degrada homem e natureza, ameça todos os direitos humanos. Aprofundando a democracia, devemos aspirar um novo marco civilizacional: o socialismo.
A blogosfera e as redes sociais são o calcanhar de Aquiles de José Serra, e não é de agora. Na campanha eleitoral de 2010, o tucano experimentou, pela primeira vez, o gosto amargo da quebra da hegemonia da mídia que o apóia – toda a velha mídia, incluindo os jornalões, as Organizações Globo e afins. O marco zero desse processo foi a desconstrução imediata, online, da farsa da bolinha de papel na careca do tucano, naquele mesmo ano, talvez a ação mais vexatória da relação imprensa/política desde a edição do debate Collor x Lula, em 1989, pela TV Globo. Aliás, não houvesse a internet, o que restaria do episódio do “atentado” ao candidato tucano seria a versão risível e jornalisticamente degradante do ataque do rolo de fita crepe montado às pressas pelo Jornal Nacional, à custa da inesquecível performance do perito Ricardo Molina.
A blogosfera e as redes sociais são o calcanhar de Aquiles de José Serra, e não é de agora.
A repercussão desse desmonte midiático na rede mundial de computadores acendeu o sinal amarelo nas campanhas de marketing do PSDB, mas não o suficiente para se bolar uma solução competente nas hostes tucanas. Desmascarado em 2010, Serra reagiu mal, chamou os blogueiros que lhe faziam oposição de “sujos”, o que, como tudo o mais na internet, virou motivo de piada e gerou um efeito reverso. Ser “sujo” passou a ser um mérito na blogosfera em contraposição aos blogueiros “limpinhos” instalados nos conglomerados de mídia, a replicar como papagaios o discurso e as diatribes dos patrões, todos, aliás, alinhados à campanha de Serra.
Ainda em 2010, Serra tentou montar uma tropa de trolls na internet comandada pelo tucano Eduardo Graeff, ex-secretário-geral do governo Fernando Henrique Cardoso. Este exército de brucutus, organizado de forma primária na rede, foi facilmente desarticulado, primeiro, por uma reportagem de CartaCapital, depois, por uma investigação do Tijolaço.com, blog noticioso, atualmente desativado, do ministro Brizola Neto, do Trabalho.
Desde então, a única estratégia possível para José Serra foi a de desqualificar a atuação da blogosfera a partir da acusação, iniciada por alguns acólitos ainda mantidos por ele nas redações, de que os blogueiros “sujos” são financiados pelo governo do PT para injuriá-lo. Tenta, assim, generalizar para todo o movimento de blogs uma realidade de poucos, pouquíssimos blogueiros que conseguiram montar um esquema comercial minimamente viável e, é preciso que se diga, absolutamente legítimo.
Nos encontros nacionais e regionais de blogueiros dos quais participo, há pelo menos três anos, costumo dar boas risadas com a rapaziada da blogosfera que enfrenta sozinha coronéis da política e o Poder Judiciário sobre essa acusação de financiamento estatal. Como 99% dos chamados blogueiros progressistas (de esquerda, os “sujos”) se bancam pelo próprio bolso, e com muita dificuldade, essa discussão soa não somente surreal, mas intelectualmente desonesta. Isso porque nada é mais financiado por propaganda governamental e estatal do que a velha mídia nacional, esta mesma que perfila incondicionalmente com Serra e para ele produz, não raramente, óbvias reportagens manipuladas. Sem a propaganda oficial do Banco do Brasil, da Caixa Econômica Federal e da Petrobras, todos esses gigantes que se unem para defender a liberdade de imprensa e expressão nos convescotes do Instituto Millenium estariam mendigando patrocínio de açougues e padarias de bairro para sobreviver.
Como nunca conseguiu quebrar a espinha dorsal da blogosfera e é um fiasco quando atua nas redes sociais, a turma de Serra tenta emplacar, agora, a pecha de “nazista” naqueles que antes chamou de “sujo”. É uma estratégia tão primária que às vezes duvido que tenha sido bolada por adultos.
Um candidato de direita, apoiado pelos setores mais reacionários, homofóbicos, racistas e conservadores da sociedade brasileira a chamar seus opositores de nazistas. Antes fosse só uma piada de mau gosto.
Finalmente, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel)
decidiu tomar vergonha na cara e punir as poderosas empresas do setor. Acuada
pelo vendaval de queixas dos clientes, ela resolveu suspender as vendas de
linhas telefônicas da TIM, Oi e Claro em todo o país. A medida vale a partir da
próxima segunda-feira e as empresas terão um prazo de 30 dias para apresentar
planos de melhoria na qualidade dos serviços. A decisão foi considerada
“exagerada” pelas teles, mas agradou milhões de usuários.
A empresa que não
cumprir a decisão será multada em R$ 200 mil ao dia. Para voltar a vender seus
chips, as três teles, que juntas controlam 70% do mercado, terão que apresentar
um plano de ajuste para sanar problemas de atendimento ao consumidor e de
qualidade. É a primeira vez que a Anatel adota uma medida mais dura contra estas
corporações. A mais atingida é a italiana TIM, proibida de vender seu chip em 18
estados. A decisão fez as ações das três empresas despencarem na Bolsa de
Valores.
A gritaria do “deus mercado”
O caos na telefonia chegou a níveis insustentáveis. O
próprio ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, sempre tão conciliador com as
teles, perdeu a paciência. “Estavam nos procurando até na rua para reclamar dos
serviços”, afirmou. “Tem hora que não dá. Não podemos ficar numa posição
completamente indefensável”, alegou. Já o presidente da Anatel, João Rezende,
justificou que “a medida é extrema”, mas era inevitável. Ele criticou a redução
dos investimentos das empresas, a maioria de multinacionais.
Diante da inédita decisão, a gritaria do “deus-mercado” já
começou. Até a embaixada da Itália teria procurado o Itamaraty para reclamar dos
prejuízos da TIM. Já as teles estão em pé de guerra. Elas anunciaram que tomaram
medidas jurídicas para reverter a decisão, que consideram “exagerada” e
“desproporcional”. Neste esforço, as teles contam com a ajudinha de alguns
“calunistas” da mídia, que insinuam que a medida é “demagógica”,
“eleitoreira”.
Mídia pregou a privatização do setor
Eliane Cantanhêde, a da “massa cheirosa” do PSDB, escreveu:
“Depois de combater os juros altos, usar o Dia do Trabalho para atacar a ‘lógica
perversa’ dos bancos, suspender (via ANS) 268 planos de saúde e 37 operadoras,
agora é a vez de Dilma guerrear com as companhias de telefones celulares... Como
a ‘faxina’ já deu o que tinha de dar, a economia não é nenhuma vitrine e PIB até
virou bobagem, o marqueteiro João Santana deve ter tido uma boa sacada. Dilma
agora é ‘a vingadora dos consumidores'”.
Mesmo criticando as teles, até para não se indispor com
milhões de usuários, a mídia privada vende a ideia de que o governo é o único
culpado pelo caos na telefonia. Ela fez campanha aberta pela privatização do
setor. Alguns impérios midiáticos, em especial a Rede Globo, até nutriram o
sonho de abocanhar pedaços da telefonia – mas foram atropelados pela “jamanta”
das teles. Agora, diante da degradação dos serviços e da revolta dos usuários,
eles culpam o governo e tentam limpar a barra dos seus ricos anunciantes.
Anatel tenta apagar o incêndio
De fato, o governo errou muito no setor. Mas foi ao não ter
tomado medidas mais duras no passado. Como aponta Flávia Lefèvre, da associação
de defesa do consumidor ProTeste, a degradação dos serviços é notória e decorre
de dois fatores. “Um deles é a inércia de anos do Ministério das Comunicações em
promover a revisão do marco regulatório das telecomunicações... O outro fator é
a resistência do governo em cumprir o que determina a Lei Geral de
Telecomunicações (LGT), no sentido de que os serviços essenciais devem ser
prestados obrigatoriamente no regime público, mesmo que concomitante com o
regime privado”.
Para ela, as poderosas teles se aproveitaram do vazio
normativo e da omissão da Anatel para degradar os serviços, implantando as suas
infraestruturas “exclusivamente com a lógica do lucro”. Esta visão privatista
aumentou a concentração no setor. “Esses grupos econômicos, que desfrutam de
vantagens como a cobrança abusiva da assinatura básica e de valores astronômicos
pelo uso das redes móveis e que gozam da fiscalização insuficiente pela agência,
são também os que desrespeitam historicamente o consumidor. Depois de tanto
desmando, resta agora à Anatel apagar o incêndio, que poderia ter sido
evitado”.
Antes tarde do que nunca! Espera-se que o governo não recue
mais uma vez diante do poderio das teles e da gritaria da mídia!
Novas gravações da Polícia Federal mostram Carlinhos Cachoeira e Demóstenes Torres fazendo negócios em nome do governador de Goiás, Marconi Perillo
ÉPOCA teve acesso a novas conversas telefônicas interceptadas pela Polícia Federal na Operação Monte Carlo – que, no final de fevereiro, deslindou a infiltração do crime organizado no governo de Goiás. A íntegra das conversas – 5,9 gigabytes de informação – corre sob segredo de Justiça na 11ª Vara Federal de Goiânia. Nela, encontra-se fartura de trechos inéditos – e explicitamente reveladores, sobretudo sobre o envolvimento do tucano Marconi Perillo, que governa o Estado de Goiás, com o esquema liderado pelo bicheiro Carlinhos Cachoeira e pela construtora Delta. Entre outras novidades, há diálogos em que se diz que Perillo “mandou passar” à Delta um contrato que poderia render R$ 1,2 bilhão. Noutros diálogos, cita-se Perillo como responsável por ordenar, por intermédio do ex-senador Demóstenes Torres (ex-DEM), que o diretor do Detran no Estado, indicado por Cachoeira, contratasse uma empresa de um amigo do governador. Descobre-se, ainda, que um irmão de Perillo, chamado Antônio Pires Perillo, ou Toninho, tinha um celular Nextel habilitado nos Estados Unidos para conversar com Cachoeira – e que Toninho prestou serviços a ele.
ESCOLHA
O governador Marconi Perillo. De acordo com a Polícia Federal, ele se empenhou para que uma obra em Goiânia fosse entregue à construtora Delta (Foto: Dida Sampaio/AE)
Desde que a existência da quadrilha de Cachoeira veio a público, em fevereiro, sabia-se que a força do grupo escorava-se, entre outros políticos, no senador Demóstenes. O envolvimento de Perillo aparecia, até então, por indícios. Na semana passada, ÉPOCA revelou as evidências – contidas num relatório enviado pela PF à Procuradoria-Geral da República – de que a Delta firmara um “compromisso” político com Perillo: comprara a casa que o governador vendia, pagara R$ 500 mil a mais do que ela valia – e passara a receber em dia o que o governo de Goiás lhe devia.
De acordo com as gravações, outros acertos de Perillo com as empresas ligadas ao esquema de Cachoeira acontecem em março de 2011, logo após a venda da casa para a Delta. No dia 1º de março, Perillo vende a casa. No dia 2, começam os negócios. Às 21 horas, Demóstenes liga para Cachoeira. O assunto é urgente: Demóstenes tem um “recado” a transmitir a Cachoeira. De quem? De Perillo. Descobre-se, portanto, que a relação de Perillo com a quadrilha de Cachoeira era ampla – envolvia não apenas seu assessor Wladmir Garcez, que acabara de intermediar os pagamentos da Delta pela casa, mas também Demóstenes. Diz Demóstenes: “Fala, professor. O seguinte: tava precisando falar com você. Ou se você não puder, manda o Wladmir (Garcez) falar comigo. Não é nada daquele assunto, não. É outro, que apareceu agora. É um recado do Marconi. Precisava te passar” (ouça o áudio). Cachoeira pergunta se Demóstenes está em Goiânia. “Tô aqui”, diz Demóstenes. “Se você puder vir aqui... Se não puder, manda o Wladmir que eu explico o que é.” Cachoeira não titubeia: “Vou aí agora então”.
Pouco mais de meia hora depois, após o encontro com Demóstenes, Cachoeira liga para o presidente do Detran de Goiás, Edivaldo Cardoso, conhecido como Caolho. Caolho fora nomeado para o cargo assim que Perillo assumiu o governo, segundo a investigação, por indicação de Cachoeira, que o encarregara de assegurar que a Delta e demais “empresas amigas” faturassem alto não somente no Detran, onde ele assinaria contratos e autorizaria pagamentos, mas também nas demais áreas do governo de Goiás. Como Caolho faria isso? Graças a seu acesso privilegiado à cúpula do governo tucano, Caolho tinha bom trânsito com Perillo e seus assessores. Deveria ainda manter Cachoeira a par de possíveis novos projetos do governo.
É nesse contexto que transcorre o diálogo entre Cachoeira e Caolho naquela noite de março – um breve, porém claro, sinal do empenho de Perillo em ajudar a turma. Cachoeira diz a Caolho: “Tenho um recado do Marconi e do Demóstenes para você”. Caolho pergunta do que se trata. “Por telefone é ruim, né?”, afirma Cachoeira. Ato contínuo, Caolho pergunta se os dois podem se encontrar. Cachoeira, cansado depois de um dia intenso e sem encontrar uma brecha na agenda do dia seguinte, acaba transmitindo o recado de Perillo por telefone. “Você teve com a Politec?”, diz Cachoeira. “Tive, ué”, responde Caolho. Temendo uma bronca, Caolho se adianta e conta tudo: “Quem mandou, pediu para eu receber a Politec foi o Marconi (Perillo). Ligou e pediu para eu receber o cara (da empresa Politec)” (ouça o áudio). Cachoeira confirma: “Aí mas ele (Perillo) não lembra, não. O problema é esse. Ele falou lá que você tinha que fechar (com a Politec), o negócio deles lá”.
Caolho explica em detalhes a ordem de Perillo para contratar a Politec. “O homem (Perillo) que ligou para mim. O Barros (Carlos Alberto Barros, fundador da Politec) estava lá no palácio, ele (Perillo) me ligou, falou comigo pessoalmente para eu receber o cara lá”, diz. Cachoeira determina então que Caolho resolva logo o contrato com os executivos da Politec: “O Demóstenes falou para você nem chamar o Marcelo (Marcelo Augusto Gomes de Lima, gerente de projetos da empresa)”. Caolho conta que a Politec já o procurara para oferecer serviços de vistoria para carros. Diz Caolho: “Esse negócio foi o Marconi que pediu. (...) Ele (Perillo) ligou e eu atendi. Não mandou recado, não. Ligou no telefone e falou assim, ó: ‘Eu tô aqui com o Barros (da Politec). Você conhece ele? Ele vai te procurar. Você pode receber ele aí hoje?’ Eu disse: ‘Posso, governador, manda ele vir aqui que eu falo com ele agora’”. Perillo, segundo o relato de Caolho, é direto: “(Perillo) falou: ‘Atende ele (Barros, da Politec) aí que é meu amigo, tá?’”.
Ao perceber que o assunto já estava encaminhado no Detran, Cachoeira se irrita com a pressão de Perillo e ordena que Caolho explique a situação aos executivos da Politec. Diz Cachoeira: “Fala para eles (Politec): ‘O que foi politicamente combinado já está fechado’”. Caolho também reclama: “Povinho estressado... E o Marconi também tem uma memória de grilo”. “Mas aí você já passa lá amanhã e resolve esse estresse”, diz Cachoeira. Em seguida, ele afirma que os executivos da Politec também pressionaram Demóstenes. Noutra ligação com Cachoeira, cinco minutos depois, Caolho está mais leve: “Amanhã resolvo isso. Hahaha! Eu acho divertido um negócio desses. O governador manda receber o cara, o cara chega para mim e diz que conversou com ele. (...) ‘O senhor (Barros, da Politec) só põe no papel aqui para mim que eu vou autorizar’: foi essa minha conversa com ele (da Politec)”.
Os interesses da Politec, do amigo de Perillo, foram atendidos. A empresa conseguiu prestar serviços ao Detran, presidido por Caolho, sem licitação nem contrato formal. O serviço de vistoria de carros, antes feito por múltiplas empresas credenciadas, passou a ser executado exclusivamente pela Politec. Em fevereiro deste ano, o Departamento Nacional de Trânsito, o Denatran, detectou irregularidades no sistema oferecido pela Politec ao Detran de Goiás. Descobriu-se que a Politec não era homologada no Denatran nem repassava as informações das vistorias ao banco de dados do órgão – brecha que permitia, em tese, que carros roubados ou fora dos padrões de segurança fossem revendidos. Diante dos fatos, o promotor Rodrigo Bolelli determinou ao Detran goiano que encerrasse a contratação informal da Politec.
A Politec, que nasceu em Goiânia, é uma grande empresa de tecnologia. Vale R$ 254 milhões e mantém contratos com governos estaduais, além do governo federal. Desde que Perillo virou governador, no ano passado, recebeu R$ 8 milhões do Estado de Goiás. Quando Barros abordou Perillo no ano passado, a Politec já estava encalacrada com a PF. Em 2009, ela e outras três empresas foram alvo da Operação Mainframe, ação conjunta da Polícia Federal e da Secretaria de Direito Econômico (SDE) contra o cartel que presta serviços de informática ao governo federal. Num dos endereços vasculhados pelos agentes da PF foram encontradas anotações com nomes de políticos e valores anotados ao lado. Havia, segundo os investigadores, o nome de um senador – a identidade dele é mantida sob sigilo. As investigações desse caso ainda estão em curso.
Caolho era mesmo próximo a Perillo? Ao que tudo indica, sim. Semanas depois da pressão para a contratação da Politec, no dia 30 de março, Perillo foi jantar na casa de Caolho, ao lado de Cachoeira – e admite isso. Escutas da PF revelam que Cachoeira e Caolho esmeraram-se nos preparativos para o convescote. Num dos áudios, Cachoeira afirma que levaria uma garrafa de vinho e uma de champanhe ao encontro. Pouco antes da tertúlia, Cachoeira liga para Garcez e pede que se apresse: Perillo deveria chegar antes do previsto. Esse jantar é um dos três encontros que Perillo admite ter tido com Cachoeira. O segundo foi na sede do governo goiano. O terceiro, na casa do ex-senador Demóstenes Torres (ouça o áudio).
As novas investigações da PF também se referem a um segundo caso: a instalação em Goiânia do VLT, veículo leve sobre trilhos. Na tentativa de criar uma agenda positiva, Perillo reuniu secretários na semana passada para definir o cronograma da licitação que escolherá a empresa responsável pela instalação do trem. Perillo espera que, na segunda quinzena de agosto, o edital seja lançado. O VLT deverá fazer a ligação leste-oeste da cidade, com 12,9 quilômetros de extensão, uma obra incluída no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
Segundo a investigação da PF, as articulações do governo, no ano passado, para implantar o VLT em Goiânia ficaram comprometidas porque o contrato fora dirigido para a Delta. Num diálogo interceptado no dia 30 de março de 2011, Garcez narra a Cachoeira uma conversa mantida com o presidente da Agência de Transportes e Obras Públicas (Agetop) e tesoureiro de Perillo na campanha de 2010, Jayme Rincón. Nesse diálogo, segundo Garcez, Rincón disse que o governador escolhera a Delta para administrar as obras. “O governador já tinha falado com ele (Rincón) sobre o negócio do VLT e que é pra passar o negócio pra Delta”, afirmou (ouça o áudio). Em entrevista a ÉPOCA, Rincón disse não ter conversado com Garcez sobre o VLT: “Não tem a menor consistência. Nem se cogitava o VLT. Esse assunto não é afeito a minha área”. ÉPOCA perguntou a ele por que participara da reunião com Perillo no início da semana, para tratar justamente desse assunto. Rincón afirmou que acompanha temas de infraestrutura do governo goiano e que a única participação da Agetop será ceder funcionários para elaborar uma carta-consulta ao BNDES.
As investigações da PF trazem ainda um terceiro assunto à tona: o envolvimento de Antônio Perillo, irmão do governador, com a quadrilha de Cachoeira. De acordo com os áudios, ele pertencia ao clube dos que usavam aparelho Nextel para falar com integrantes da turma do bicheiro. Numa das ligações, Cachoeira pergunta onde Toninho está. Toninho diz que está na saída de Goiânia. Diante de um convite de Cachoeira para encontrá-lo na sede da Delta Construções, Toninho foi rápido: “Vamos agora” (ouça o áudio). Em outro telefonema, Cachoeira demonstra intimidade com ele. “Toninho, você me chamou aqui e desligou o telefone. Tá parecendo aquelas biscates”, diz Cachoeira. Em 8 de abril do ano passado, Cachoeira conversa com Roberto Coppola, seu sócio argentino no ramo dos jogos de azar. Quando Cachoeira informa a Coppola sobre a possibilidade de ir a Buenos Aires na Semana Santa,Coppola diz que Toninho também iria à Argentina no período (ouça o áudio). Toninho chegou a acionar Garcez, em 14 de fevereiro deste ano, para perguntar por que seu Nextel não funcionava. No mesmo dia, Eliane Pinheiro, ex-chefe de gabinete de Perillo, pede a Garcez que verifique a situação do aparelho, pois “Toninho está de viagem marcada para Miami”.
O governador Marconi Perillo afirmou que “jamais disse a quem quer que seja” para passar as construções do VLT de Goiânia para a Delta. “Esta afirmação é infame e irresponsável. Como é que o governador poderia pedir a alguém para ‘passar uma obra’ que não existia nem no papel nem se sabia ainda se seria executada?”, afirma. Segundo Perillo, o projeto do VLT ainda está em fase de elaboração. Em relação à Politec, Perillo afirmou que “todos os empresários que o procuram são por ele encaminhados aos órgãos competentes para que se inteirem dos projetos e assuntos relacionados ao governo”. Tudo isso, segundo ele, de forma transparente. “As informações são prestadas pelos responsáveis por cada área do governo sempre obedecendo aos princípios de ética, lisura e transparência.” Perillo foi questionado também sobre as relações de seu irmão com Cachoeira, incluindo o aparelho Nextel doado pelo grupo do bicheiro. Perillo disse que a pergunta deveria ser formulada ao irmão e que não tem conhecimento desse assunto. No comunicado, Perillo disse que não mais se pronunciará a respeito de assuntos de ordem pessoal. “Não cabe alimentar ilações retiradas fragmentadamente de mais de 30 mil horas de gravações, com o único intuito de criar polêmicas e estabelecer relações entre fatos que não se coadunam. Entre todas as gravações divulgadas, não existe nenhuma comprobatória de negócio ou contrato que efetivamente tenha beneficiado alguma pessoa ou empresa.”
A crer na versão de Perillo, o que se lê, ouve e se descobre a cada dia nas investigações da PF decorre não somente de uma sofisticada ação orquestrada “politicamente” pelo PT, mas também de uma extraordinária sucessão de coincidências e mentiras contadas por diferentes integrantes da turma de Cachoeira. Coincidências e mentiras corroboradas por cheques, transferências bancárias, atos de governo. É verdade que Garcez poderia estar usando indevidamente o nome de Perillo e ter criatividade suficiente para inventar recados ou acertos. Mas era amigo de Perillo, frequentava seu gabinete e lhe entregava cheques de Cachoeira. O mesmo vale para Cachoeira, Cláudio Abreu, da Delta, e para os demais personagens envolvidos nos repasses de dinheiro. Como se descobre agora, o mesmo sinuoso raciocínio teria de ser aplicado ainda a Caolho, Demóstenes, ao irmão de Perillo...